Resenha | Meus desacontecimentos de Eliane Brum

by - 27 julho


Meus desacontecimentos

Se tem uma coisa que gosto imenso de fazer, é passear entre prateleiras, principalmente as da Livraria Cultura... no Conjunto Nacional. Sempre que estou nas imediações, me atrevo por lá... e, saio a caça de títulos-capas-personagens-tramas e seus respectivos autores. Geralmente procuro pelo que conheço e reconheço mas, eventualmente acabo diante do desconhecido.
Raramente saio de mãos vazias. Amparada pelo meu instinto de leitora, já descobri muitos dos meus livros favoritos... no acaso dos passos-toques-e-olhares.

Na noite de ontem... depois de sair do cinema, escolhi repetir o ritual. Caminhei seguro por aquele universo peculiar observando as coleções, sem compromisso, o que me fez recordar um Título — um desses lançamentos recentes que aguçam o paladar — que me levou ao balcão de atendimento, para uma rápida consulta.

E, enquanto aguardava pela minha vez... observei os livros deixados ali, para serem devolvidos as prateleiras. Dentre eles, a capa branco-leite, com um desenho simples-gostoso que me fez ir e vir de minha infância se ofereceu ao meu olhar e eu o degustei num apropriar-se morno. O título num estalar de dedos me remeteu à Pessoa... e pronto! estabelecemos uma espécie de contato imediato de primeiro grau.

Como quem tem sede... folheei as primeiras páginas e, para minha surpresa, reconheci a autora de outros cenários — era o nome por trás das colunas lidas pela manhã, antes da vida acontecer. Avancei por entre os meus espaços de memória. Virei as páginas de maneira febril, aterrissando outras realidades.

Me perdi e fui trazida de volta... pela voz do atendente, que me retirou daquele transe, com suas respostas cheias. Ele tinha em mãos o livro-outro-lançamento...

Às vezes, penso que os atendentes da Livraria Cultura são magos disfarçados — eles sempre conseguem o que eu quero-preciso... e estão sempre prontos para falar de autores-livros. Não fazem caretas quando anuncio que nas minhas prateleiras há diferentes versões de um mesmo livro.

E, com os dois livros em mãos... me dirigi ao caixa. Enquanto esperava, fui desbravando a realidade de Eliane Brum, que escolheu contar sua vida através das palavras em narrativas que são diálogos cheios-imensos-únicos. Logo ao abrir o livro nos deparamos com sua voz, de maneira inquieta, a se questionar — e ao fazê-lo, estende o questionamento a nós, leitores —, como cada um inventa uma vida? Como cada um cria sentido para os dias, quase nu e com tão pouco? Me sentia acabar-desmoronar... e recomeçar.

Eliana Brum, em cada página, nos convida a passar um tempo em sua companhia... como se nos esperasse para o famoso chá das cinco, com a mesa posta e as histórias enfileiradas para uma troca.

Eu degustei cada palavra... realidade e ficção. Leitor e Autor... dentro e fora. Fora e dentro. O lado A e B de uma trama, da qual a gente se apodera, por ser também a nossa história, contada por uma mulher que vai pincelando a si... melhorando e piorando esse passado que nos acena de dentro das páginas-corpo-memória.

Ao final, ali na página cento e dezoito, você encontra a palavra silêncio. Pois bem, não se sabe se vida ou morte, se fim ou começo, se verdade ou mentira. Mas eu solucei. Parei, fiquei muda, sem ar... e novamente me senti acabar. Desde então... ainda não voltei para casa-corpo... tempo presente. Mas não tenho pressa, porque já recomecei a leitura e me vi a bordo de outros passados... igualmente meus-dela-alheios, porque como propõe o livro... estou a me desacontecer.

 Meus desacontecimentos




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6 comentários

  1. Por seu intermédio, li apenas uma passagem e senti que, ali, podemos desacontecer com prazer...

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  2. Hoje vaguei por suas linhas! e aqui, movida pela tua mão eu respiro tudo aquilo que me levou até tu... sua sensibilidade me abraça, bambina mia.
    Grazie per tutti

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  3. Ah essas visitas que fazemos às livrarias, eu mesmo me perco por horas e horas na Saraiva!

    www.estante450.blogspot.com.br

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    1. Entrar na livraria é como uma terapia né cassia?
      Obrigada pela sua visita

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